4 de dezembro de 2012

Cubanos conhecem experiências de convivência com o Semiárido na Paraíba

Um grupo de agricultores, técnicos e pesquisadores do Programa Asociación País (CPP sigla em inglês para Country Partnership Program) do Governo Cubano visitou a Paraíba entre os dias 26 e 30 de novembro para conhecer experiências de combate à desertificação e de convivência com o Semiárido desenvolvidas pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA).

A visita, que contou com a parceria do Instituto do Semiárido (Insa), é um desdobramento de um ciclo de intercâmbios entre a ASA e o Governo Cubano para a troca de experiências de desenvolvimento rural referentes à gestão dos recursos hídricos, manejo integrado das criações animais, manejo da fertilidade do solo e a produção de alimentos. O Programa Asociación País busca desenvolver capacidades e condições em Cuba para o manejo sustentável da terra de forma que contribua com a manutenção da produtividade e funcionalidade dos ecossistemas. A delegação de cubanos é formada por seis pessoas de duas regiões extremas da ilha de Cuba: Rio Pinas e Zona Costeira de Maisí-Guantánamo. Ambas apresentam problemas severos de degradação da terra, assim como sofrem eventos climáticos extremos. Na primeira, tem-se alternância de períodos secos e chuvosos, mas na segunda vive-se uma seca crônica.

Foi para intercambiar conhecimentos que a delegação visitou comunidades rurais e experiências de famílias agricultoras na região de atuação do Coletivo das Organizações da Agricultura Familiar do Cariri, Seridó e Curimataú, na região do Cariri Ocidental e na região do Polo da Borborema. O grupo também teve a oportunidade de apresentar suas experiências de manejo sustentável da terra e luta contra a desertificação e da seca em um dia de programação na sede do INSA.

De acordo com Marta Paula Ricardo Calzadilla, da Unidade de Coordenação Central do CPP, que liderou a visita, a equipe ficou sabendo do trabalho da ASA quando participou, em 2011, de um encontro do “Projeto Palma”, em Havana. Naquele momento, um grupo da ASA Paraíba havia ido a Cuba conhecer a experiência cubana com a promoção da segurança e soberania alimentar e apresentar suas experiências: “aí conhecemos o Semiárido brasileiro e como se trabalhava aqui em função da sobrevivência com o Semiárido. Nossa coordenação de projetos, que trabalha para um manejo sustentável do solo, fez contato com a ASA para que pudéssemos vir trocar experiências”, disse Marta Paula.
“Ficamos surpresos como se preparam para conviver com a falta de chuvas. Em Cuba temos muitos bons agricultores, mas a maioria não está tão bem preparada. Outra coisa é a forma como se ajudam, as nossas cooperativas se ajudam bastante, mas é admirável como cooperam, tem isso de vamos contribuir aqui e amanhã ali”, completou Marta.

Adel Suarez Gonzales, vive na província de Pinar Del Rio, lado ocidental da ilha, zona menos árida. Ele ficou impressionado com a maneira com que as famílias agricultoras guardam forragem para os animais, o processo de silagem e como utilizam os recursos que possuem na propriedade como alimento: “Nós não usamos a palma para alimentar o gado. Fiquei muito surpreso como fazem isso aqui e os benefícios que traz. Com certeza vou experimentar, pois lá temos bastante palma, mas só a usávamos como barreira”, conta o agricultor.

Segundo Teudes Limeres Jimenez, Diretor e Pesquisador do Instituto de Solos na Província de Guantanamo, região semiárida de Cuba, que há 25 anos trabalha com o tema da desertificação, eles sempre tiveram acesso a biografias e notícias sobre experiências do México, também do Chile, mas não tinham conhecimento da imensidade que ocupa o Semiárido brasileiro: “Ao chegar aqui ficamos muito impressionados com o que vimos: uma comunidade muito organizada, que trabalha em harmonia com os técnicos da ASA e de outras instituições como o Instituto Nacional do Semiárido e que trabalham com muito amor e unidade. Temos visitado outras experiências em outros lugares mas, nunca tínhamos visto algo assim, aprendemos muito. Nosso país vem trabalhando a agroecologia há muitos anos, mas aqui vimos uma agroecologia sendo executada em condições muito difíceis, no entanto as famílias tem conseguido sobreviver e inclusive com certo nível de desenvolvimento, produzindo seu alimento e criando condições de moradia, de produzir alimentos sem veneno, livre de transgênicos”, relata o pesquisador.

O trabalho com as sementes e o manejo da água são experiências desenvolvidas que também impressionaram a missão de Cuba: “O que a ASA conseguiu junto ao Governo, o projeto das cisternas, é fenomenal. Nós levaremos isso também para Cuba porque é uma experiência que permite que os camponeses continuem vivendo no Semiárido, que não o abandonem, é a solução, porque vão ter a água para beber durante os nove meses que não chove. Creio que os agricultores que nos acompanharam durante a visita puderam ver com seus próprios olhos e tocar com suas mãos e saber que é uma realidade possível. Também um trabalho impressionante é o trabalho que estão fazendo com os bancos de sementes, sementes adaptadas à localidade, como as ‘Sementes da Paixão’. Nós dizemos que não podemos levar as sementes, mas levamos a paixão. E realmente é muito impressionante porque todo agricultor tem garantido suas sementes para quando chega o período da chuva”, afirma Teudes.

O intercâmbio evidenciou uma forte identidade entre as ações desenvolvidas pelo Governo Cubano e aquelas promovidas pela ASA e pelo INSA. Foi identificado um conjunto de pontos potenciais de colaboração e forte interesse de estreitamento das relações. Para tanto se propôs a elaboração conjunta de um termo de cooperação técnico-científica entre INSA-ASA e o Programa Asociación de País.

Base importante das experiências visitadas integram a ação do Projeto Terra Forte que tem o objetivo de contribuir para a reversão e prevenção dos processos geradores da desertificação e do empobrecimento da população no Semiárido brasileiro. O Terra Forte é desenvolvido pela a AS-PTA em parceria com o Polo da Borborema, Patac e AVSF e é cofinanciado pela União Europeia.


Redação: Assessoria AS-PTA 
Fonte: http://www.asabrasil.org.br/Portal/Informacoes.asp?COD_NOTICIA=7604

15 de outubro de 2012

Avanço do agronegócio na região Semiárida da Paraíba

Imagem da Internet
A comunidade rural Prainha do município de Cubati, localizado a 66,5 km de João Pessoa, ainda é caracterizada pela resistência da agricultura familiar. Inúmeras pequenas propriedades rurais tentam sobreviver em meio à falta de incentivos dos poderes públicos, o que na maioria das vezes força os agricultores a se submeterem as pressões do agronegócio.
 
Agricultores e agricultoras são submetidos ao trabalho informal, com baixíssima remuneração e sem nenhuma segurança. Trabalham semanalmente ou de acordo com o período da produção nas plantações de tomate e na mineração, mas mesmo quando possuem algum pedaço de terra, são muitas vezes obrigados (pela necessidade financeira) a arrendar suas propriedades para a monocultura à base de agrotóxicos.
 
Para além do caso de Rosália Barbosa de Souza, que veio a óbito por ter mantido contato permanente com os agrotóxicos enquanto trabalhava na produção de tomate, o descaso do poder público sobre as questões dos direitos trabalhistas vem ocorrendo com frequência em todo o estado. É recorrente os casos de irregularidades jurídicas, super exploração, trabalho infantil, acidentes, falta de equipamento de proteção e negligência dos direitos trabalhistas.
 
Nos casos de arrendamento de terras, além dos riscos à saúde da terra e das pessoas que permanecem residindo próximas aos plantios, a contratação é feita sem nenhuma segurança, não existe nenhum tipo de documentação ou registro do contrato. Durante o período do plantio à colheita a família fica impedida de, até mesmo, entrar na área cultivada. Ao fim da colheita, após quatro meses, o proprietário da terra recebe a quantia de R$ 1.000,00 (um mil reais) por cada hectare arrendado.
 
Durante o período de colheita dos tomates, praticamente toda a comunidade se envolve no trabalho. Homens, mulheres, adultos, jovens e mesmo crianças são levadas as plantações e recebem, ao fim do dia, cerca de R$ 25,00 (vinte e cinco reais) pela diária de trabalho.
 
Dona Maria de Sueli Lima Souza (mãe da jovem Rosália Barbosa) comenta revoltada com a situação, mesmo após a morte de Rosália, um de seus filhos continua insistentemente trabalhando nas plantações de tomate: “Eu to com um menino com o mesmo problema, trabalhando dentro da tomate! Eu já pedi, o pai já pediu pra ele sair, porque eles trabalham sem proteção nenhuma, mas ele não quer atender a gente. Diz que é o ganho que tem, que num pode sair que é o ganho que tem, mas ele num sabe que é a vida dele que ta em jogo, nem vendo a irmã morrer, que a gente tem quase certeza que foi isso, ele não atende ninguém, num quer, vai continuar trabalhando lá”.
 

Casa da família de Rosália
Todos trabalham sem nenhum tipo de proteção, manipulam e aplicam os produtos químicos sem sequer a utilização de uma máscara. Marizaldo Pereira Alves, esposo de Rosália, afirma: “Essa coisa de tomate não tem futuro, não. É muito veneno que o cabra engole, num tem roupa, num tem calçado, num tem nada, trabalho bem dizer nu dentro de um campo de tomate e os donos só quer saber deles, de ganhar e ganhar e pronto, mas o cabra que precisa, né? Tem que ir mesmo, aqui a renda que tem é essa (Bolsa Família), num tem outra, aí todo mundo vai mesmo!”.
 
De acordo com a professora de medicina da UFCG em Cajazeiras/PB, Ana Carolina de Souza Pieretti, aparentemente este não tem sido um tema de preocupação do conselho federal de medicina: “O órgão que mais tem tomado à frente nestas discussões tem sido a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), mas ainda apresenta dificuldade em refrear o uso de agrotóxicos pelo grande poder econômico tanto das empresas produtoras quando do agronegócio. Em minha opinião deve haver mais estudos e uma regulamentação mais forte, além da discussão na sociedade de que modelo de produção agrícola é bom para a saúde das pessoas. Certamente o agronegócio não é este modelo”.
 
Nesse contexto, diversos movimentos e organizações sociais ligadas à agricultura familiar camponesa lutam contra o avanço do modelo de desenvolvimento do agronegócio na região semiárida do país. No entanto a luta ainda é bastante desigual, e se torna inviável garantir o enfrentamento apenas com ações de acompanhamento e assistência técnica às famílias agricultoras. É o que aponta Maria da Glória Batista, representante da Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA Brasil): “Temos trabalhado com a disseminação de iniciativas, dos cultivos, da criação de animais integrada e valorizando a biodiversidade local no desenvolvimento do semiárido com base na agroecologia, como a exemplo: o resgate das sementes nativas, dos animais nativos e adaptados, da recuperação, conservação e manejo da biodiversidade local”.
 
Dessa forma as manifestações populares tornam-se um importante instrumento de enfrentamento com capacidade de chamar a atenção dos poderes públicos e da sociedade sobre os principais problemas enfrentados no campo. Nesse sentido, as organizações e movimentos sociais cumprem com o papel significativo no processo de articulação e conscientização política. Maria da Glória, acrescenta ainda: “do ponto de vista político, vem sendo feito um trabalho junto às organizações, com a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, e demais campanhas contra qualquer iniciativa voltada para o agronegócio. Na região do semiárido, as organizações estão cada vez mais se articulando pra enfrentar o agronegócio através de campanhas, de processos de mobilização, de denúncia, no sentido de mobilizar a sociedade pra enfrentar o agronegócio. Um desafio que surge para todas as organizações desse campo, não só pra ASA, é articular, buscar diálogos e convergências junto às organizações para o enfrentamento ao agronegócio de forma coletiva”.
 
 
Patrícia Ribeiro
Comunicadora Popular ASA/Patac
Campina Grande/PB

AGROTÓXICO CAUSA MORTE NA PARAÍBA

Após trabalhar nos plantios de tomate, mantendo contato direto e intensivo com agrotóxicos, uma jovem agricultora com apenas 23 anos de idade, grávida e mãe de mais dois filhos, adquire grave doença que provoca sua morte no interior da Paraíba.
 
 
Desde abril de 2011, quando foi lançada a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, diversos movimentos sociais, grupos ambientais e demais organizações tem desenvolvido inúmeras ações de conscientização, denúncia e enfrentamento contra 07 empresas multinacionais que controlando mais de 70% do mercado de agrotóxicos no Brasil (Monsanto, Syngenta, Bayer, Novartis, Dupont, Basf e Dow), as quais estão diretamente ligadas ao grupo da bancada ruralista no senado.

Além de todas as ações se depararem com a omissão, negligência e mesmo a conivência do Estado, os movimentos sociais ainda enfrentam o silêncio das grandes mídias sobre sérias questões relacionadas ao problema do uso intensivo e indiscriminado dos defensivos químicos.
 
O Brasil atualmente é o campeão mundial no uso de agrotóxicos. Por ano, cada brasileiro consome cerca de 5 litros de agrotóxicos. Em consequência desse consumo absurdo de veneno, milhões de pessoas adquirem câncer e morrem anualmente, sem nenhum tipo de repercussão no noticiário da grande mídia.
 
Além disso, na maioria dos casos de morte em consequência dessas doenças, mesmo com a comprovação de exames clínicos, profissionais de saúde se negam a atestar nos laudos médicos a causa da morte como consequência do uso de agrotóxicos. Recentemente a Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (ABRASCO) lançou o dossiê “Um alerta sobre os impactos dos Agrotóxicos na Saúde”, o qual confirma através de evidências científicas diversas doenças resultantes da exposição, contato, uso e consumo de componentes químicos encontrados em diversos grupos de agrotóxicos consumidos no país.
 

Rosália Barbosa de Souza
De acordo com o dossiê, as pessoas expostas a esses produtos podem além de sofrer com efeitos imediatos, como intoxicação e morte, poderão sofrer com o passar de meses, anos e até décadas, com o surgimento de doenças como cânceres, má formação congênita, distúrbios endócrinos, neurológicos e mentais.
 
Num caso recente, não foi preciso que nem se quer um ano, para que uma jovem viesse a sofrer graves consequências do contato com os defensivos químicos utilizados nas lavouras de tomate na região de Cubati/PB. Trata-se de Rosália Barbosa de Souza, uma jovem de 23 anos, agricultora, casada e mãe de três filhos, que faleceu no dia 18 de julho deste ano, devido à aquisição de uma doença pouco comum: a Aplasia Medular.
 
De acordo com Ana Carolina de Souza Pieretti (professora de medicina da UFCG em Cajazeiras/PB), a aplasia medular é uma doença relativamente rara que na maioria dos casos é causada por uma doença autoimune, quando as defesas do corpo passam a atacar as células da medula óssea onde o sangue é produzido, resultando em uma anemia profunda com comprometimento de todos os tipos de células do sangue. Medicamentos, radiação, vírus, drogas e agentes químicos também podem ser associados à toxidade medular:

“Além disso, diversos fatores, que podem gerar agravos à medula óssea, onde o sangue é produzido, têm sido correlacionados com aplasia medular e outras doenças da medula como leucemia. Dentre eles destacam-se os agrotóxicos dos mais diversos tipos. Durante os últimos 30 anos tem sido reportados na literatura científica casos de aplasia medular que podem ser correlacionados ao uso de agrotóxicos. Os organofosforados, classe de agrotóxicos cuja toxidade está bem estabelecida, causou uma chance 3,2 vezes maior entre agricultores para apresentar aplasia medular em determinado estudo com trabalhadores da Tailândia, que também mostrou um risco relativo 4,75 vezes maior de ter esta doença em trabalhadores expostos aos carbamatos (classe de agrotóxicos a qual pertence o Lannate BR, usado na cultura do tomate)”.
 
De acordo com a família de Rosália a doença foi identificada durante a gestação de seu último filho. Rosália ainda estava amamentando seu segundo filho, quando ficou grávida do terceiro, durante todo esse período ela manteve contato direto e intenso com os agrotóxicos utilizados no plantio de tomates.
 
Pais de Rosália Barbosa
Ela trabalhou na plantação de tomate e ainda chegou apanhar tomate. O marido dela também trabalha, era ela que lavava a roupa dele quando ele chegava. Tudo isso é contato, né? Quando ela ia lavar roupa, chegava a sair aquela água diferente do veneno. Devido ela estar amamentando também e depois ter engravidado, as imunidade tava baixa, aí ficou mais fácil pra doença. Começou a aparecer umas manchas na pele, com uns dias começou a sangrar as gengivas e depois foi só ficando mais grave o caso” (Damião Barbosa de Souza, pai de Rosália).
 
Além dela e o marido terem trabalhado nas plantações de tomate. As terras em torno da casa onde a família residia foram alugadas para um dos maiores produtores de tomate da região, conhecido como o “Rei do Tomate”. Durante quatro meses a família esteve (literalmente) dentro do plantio de tomate, recebendo toda a carga de agrotóxico despejada pelo dono da produção.
 
Com 06 meses de gestação, ainda na Paraíba, o estado de saúde de Rosália começou a se agravar. Foi quando ela foi transferida para o Instituto Materno infantil de Pernambuco (IMIP) em Recife-PE. Lá a jovem permaneceu internada em observação e sendo submetida a inúmeros exames.
 
Ana Carolina ainda afirma que no caso especifico de Rosália, o fato da jovem ter mantido contato intensivo com agrotóxicos durante o período da gravidez é considerado um fator agravante:
 


Certidão de óbto de Rosália
O momento da gravidez é um momento delicado quando o corpo da mulher engendra um enorme esforço para gerar e nutrir um novo ser. A medula óssea é demandada a produzir mais sangue, tanto que é muito comum que as mulheres apresentem anemia leve neste momento. Passa a ser um momento então que a medula estaria mais vulnerável a agressões externas o que poderia ter contribuído para a doença. Por outro lado, os agrotóxicos podem gerar más-formações e até morte do feto. Em estudo no Mato Grosso, a região que mais consome agrotóxicos no Brasil devido ao agronegócio, foi constatado a presença de agrotóxicos no leite materno, o que também pode gerar impacto na saúde dos bebes amamentados”.
 
Ao completar sete meses de gestação com o risco de morte materna e fetal, os médicos que acompanhavam Rosália, optaram pela indução do parto prematuro do bebê. A pesar do nascimento prematuro e com todas as adversidades da gestação, a criança nasceu bem e sem nenhum tipo de complicação. De acordo com Marizaldo Pereira Alves (esposo de Rosália), foram aplicados vários exames no bebê, mas até o momento nada foi detectado e a criança passa bem.

Esposo e os três filhos de Rosália
Após o parto, apresentando complicações no quadro da aplasia e insuficiência respiratória, Rosália foi encaminhada à Unidade de Terapia Intensiva (UTI), onde permaneceu em estado continuamente agravante, até vir a óbito no dia 18 de Julho. No laudo médico consta apenas que a causa da morte foi devido a “Hemorragia pulmonar e aplasia de medula óssea”.

Com a morte de Rosália a família além de sofrer com a perda forçada da filha, sente-se revoltada com a situação que permanece na comunidade com total descaso, sem nenhum tipo de fiscalização ou controle. Após relatar o ocorrido com a filha, Seu Damião desabafa: “Eu só vou dizer uma coisa, no próximo campo de tomate que tiver aqui de frente de casa, que nem teve esse aí, eu vou procurar quem quer que seja direito, dessa vez eu brigo na justiça, mas num aceito. Vão fazer lá dentro das terras onde são dono mermo, quer morrer vão pra lá! E deixa nós que quer viver aqui em paz!”.



Patrícia Ribeiro
Comunicadora Popular ASA / Patac
Campina Grande-PB

5 de setembro de 2012

Reflexos do conflito Agricultura Familiar X Agronegócio no semiárido paraibano

Durante os dias 28 e 29 de agosto, agricultores e agricultoras das regiões do Coletivo Regional das Organizações da Agricultura Familiar do Cariri, Curimataú e Seridó Paraibano, estiveram presentes no I Seminário Regional da Criação Animal, no município de Lagoa Seca-PB.

Durante os dois dias, os participantes discutiram sobre as principais ameaças da agricultura familiar agroecológica que vem se intensificando no interior do estado e os desafios para permanecer em resistência, preservando a história e a cultura das comunidades tradicionais. Rosimare Alves, agricultora representante da comunidade Canoa de Dentro, em Pedra Lavrada, afirma: “Hoje não temos mais os animais que antes a gente tinha, e a grande preocupação nossa é que a gente valorize mais as raças que a gente ainda tem e também multiplicar. Porque se for deixar que venham outras raças de fora para tomar o espaço, a gente sabe que a nossa agricultura não vai mais ser uma agricultura saudável e uma agricultura sustentável como a que gente tinha há vinte anos”.

No encontro, foram apresentadas algumas experiências familiares que estão no caminho para a transição agroecológica, como também experiências que estão dialogando com o sistema produtivo da indústria de granjas na região. As exposições contribuíram para a comparação e avaliação do atual contexto encontrado nas diversas regiões do semiárido paraibano.

“Eu trouxe a apresentação da propriedade de minha família mostrando que a agricultura familiar é viável para nossa região e que a gente vive muito bem se a gente souber aproveitar o que tem de importante dentro da nossa propriedade” comenta Danilo Rodrigues, um jovem agricultor da comunidade Malhada de Areia, município de Olivedos-PB.

Com a chegada da avicultura industrial nas pequenas propriedades da agricultura familiar, os agricultores começam a se sentir ameaçados com o risco de competitividade e com os demais reflexos desse sistema. É o que reafirma Danilo, em uma de suas falas: “Se a gente for avaliar o que ameaça mais a agricultura familiar é a chegada dessas empresas, dessas indústrias de frango, porque isso vai prejudicando principalmente a parte da comercialização... com a participação dessas empresas eles começam a exigir mais e quem acaba perdendo é a gente”.

José Waldir, representante do Patac (ONG que presta assessoria ao Coletivo Regional), apresenta um retrato de como agricultores familiares camponeses resistem às ameaças do agronegócio, em especial a chegada da avicultura industrial: “Do ponto de vista social, econômico, ambiental e também da própria relação de trabalho, temos refletido com certa preocupação algumas relações. Primeiro a avicultura está se expressando muito fortemente em áreas na região que coincidentemente são áreas historicamente de roçado. Exige das famílias um endividamento grande junto aos bancos para poder garantir uma estrutura que tenha uma determinada padronização. Além disso, o próprio envolvimento da família no trabalho que deixa de ser na lógica da agricultura familiar e passa a ter uma ação exclusiva de cuidar desses galpões de aves, sem contar a falta de vínculos dessas empresas para com as famílias. O investimento que essas famílias fazem é em risco das famílias, galpões de 170 a 200 mil reais. A forma de trabalho não tem perspectiva de salário, décimo terceiro, férias, não tem garantia alguma”.

As famílias convivem, em seu cotidiano, com frequentes ameaças. Além de se desafiarem a superar as adversidades das condições naturais da região, as famílias agricultoras vivem em constante enfrentamento da intensificação das ações do agronegócio na região.

“Além da avicultura, também identificamos o uso intensivo de agrotóxicos, seja para plantio mais intenso e irrigações nas pequenas e médias empresas, seja pra criação de animais também especializado na produção de leite, como carrapaticidas e outros a própria modificação na raça, na genética dos animais com alta capacidade de produção de leite, seja a bovinocultura ou a caprinocultura. Então, são várias expressões do agronegócio que estão presentes. Então são assim as ameaças mais gerais que aparecem e que trazem algumas consequências, entre elas, por exemplo, a concentração da terra, há indícios claros de reagrupamento de algumas propriedades que haviam sido fracionadas, o que vem tornando algumas regiões em latifúndios”, complementa Waldir.

Ao final do encontro, os agricultores e agricultoras presentes, reafirmaram a necessidade de dar continuidade ao processo de formação política e técnica que vem sendo implementado desde a composição e articulação do Coletivo Regional. E principalmente a necessidade de fortalecer os processos de transição agroecológica que vem sendo desenvolvidos pelas famílias agricultoras que compõem essa articulação e permanecem com força e resistência no semiárido paraibano.



Patrícia Ribeiro - comunicadora popular da ASA
Campina Grande - PB
04/09/2012

23 de agosto de 2012

Seminário do Coletivo Regional discutirá sobre as problemáticas da Criação Animal no semiárido Paraibano


Próxima semana, nos dias 28 e 29 de agosto (terça e quarta-feira) será realizado o I Seminário Regional da Criação Animal do Coletivo Regional das Organizações da Agricultura Familiar do Cariri, Curimataú e Seridó Paraibano, que conta com a assessoria do PATAC.

O evento será realizado no Convento Ipuarana, em Lagoa Seca/PB e contará com a participação de agricultores e agriculturas familiares da região de atuação do Coletivo Regional, além de outras organizações da Articulação do Semiárido Paraibano.

O encontro terá como objetivo além de identificar e valorizar as experiências de criação animal em direção à transição agroecológica e da convivência com o semiárido, refletir sobre as ameaças atuais existentes na região. Como a intensificação do agronegócio, os limites do acesso a terra, a implantação dos sistemas industrializados de criação de aves, a intensificação do uso de agrotóxicos e a mineração.

Como meio para avançar nas perspectivas de organização e da luta da agricultura familiar agroecológica o seminário se propões ainda a identificar e analisar a influência das políticas públicas voltadas para criação animal.

A expectativa do Coletivo e do PATAC é que o encontro possa reafirmar a agroecologia como caminho para a sustentabilidade dos sistemas de criação animal na agricultura familiar da região do Cariri, Curimataú e Seridó Paraibano.

Encontro reflete o papel da comunicação na intervenção política da ASA


Equipe de comunicadores e técnicos dos programas estão reunidos para afinar seu olhar sobre a sistematização como processo de disseminação do conhecimento dos agricultores e agricultoras

 
Na estratégia de intervenção da Articulação no Semi-Árido (ASA), a comunicação ocupa lugar de destaque. O esforço é para desfazer a imagem de inviabilidade e pobreza atribuída à região e consolidada há centenas de anos. Desconstruir essa imagem, com profundas marcas na vida de quem nasceu por lá, significa, sobretudo, fazer essas pessoas escutarem suas vozes e se descobrirem capazes de encontrar soluções para seus desafios.

De quarta a sexta-feira desta semana (22 a 24), cerca de 50 pessoas envolvidas diretamente com as ações de comunicação da ASA estarão juntas. Do total de participantes, mais da metade são novos comunicadores e comunicadoras. A oficina acontece no Hotel Canarius, no município do Cabo de Santo Agostinho, na Região Metropolitana do Recife.

A oficina tem como proposta a construção de uma unidade de visão da equipe de comunicação sobre a sistematização de experiências. Pretende-se também lançar um olhar para a sistematização percebendo-a dentro de um contexto mais amplo de comunicação para a transformação social. Assim, a sistematização amplia seu sentido na intervenção política da ASA.

O caminho a ser construído na oficina parte dos elementos orientadores da metodologia da ASA – conceitos, princípios e crenças – para chegar na reflexão sobre a ação de sistematização como estratégia de difusão das inovações e dos conhecimentos dos agricultores e agricultoras experimentadoras.

“No Semiárido, foi a política quem decretou a concentração da terra, da água e do conhecimento e, assim, decretou também a marginalização da grande maioria da população da região”, atestou Naidison Baptista, coordenador executivo da ASA pelo estado da Bahia, que fez a fala de abertura do encontro. “Com relação à dimensão do conhecimento, os comunicadores e comunicadoras da ASA têm uma grande contribuição a dar”, completa.
Na programação da oficina, está previsto um diálogo entre os comunicadores e quatro agricultores – Rafael e Joelma, de Pernambuco, e Angeneide e Socorro, da Paraíba. Todos são muito experientes na lida com a agricultura agroecológica e alcançaram o estágio de convivência com o Semiárido.

“A proposta da ASA está para além de construir cisternas. A ASA traz um projeto político no qual a centralidade é ocupada pelo protagonismo dos agricultores. Então, a ideia de proporcionar esta conversa dos comunicadores com os agricultores e agricultoras é para o grupo perceber que a sistematização deve estar a serviço dos agricultores que produzem e disseminam conhecimento”, comenta Adriana Galvão, assessora da ASP-TA, organização que atua no Semiárido paraibano e faz parte da ASA desde seu início.

A sistematização das experiências dos agricultores familiares que vivem no Semiárido se concretiza através do boletim Candeeiro, que já superou a marca de mil edições. “Um agricultor uma vez disse que os Candeeiros são o resultado da junção do povo das letras com o povo da sabedoria – os agricultores e agricultoras. E que os mais de mil Candeeiros estão “alumiando” o Semiárido. Alumiam como? Mostrando as coisas bonitas do Semiárido e o conhecimento de quem é de lá”, contou Baptista.

Equipe renovada - Esta oficina tem um significado importante por ser a primeira realizada depois da chegada de novos comunicadores e comunicadoras na rede. “Por eu ter chegado há pouco tempo na ASA, minha expectativa é, acima de tudo, conhecer e me integrar com a equipe de comunicação, compreender melhor a linguagem que a ASA usa para se comunicar com a sociedade de uma forma geral e, com isso, absorver o máximo de conteúdo para que meu trabalho junto a ASA se desenvolva, e também contribuir um pouco com minhas vivências, por que não?”, anuncia Rodrigo Dias, comunicador da ASA pelo estado da Bahia e vinculado à Cedasb, uma organização com atuação no Semiárido baiano.



Fonte: http://www.asabrasil.org.br/Portal/Informacoes.asp?COD_NOTICIA=7461

6 de agosto de 2012

Campanha se intensifica nos estados e ganha apoio de agricultores

A mensagem "Não Troque seu Voto por Água. A Água é um Direito Seu!" está ganhando destaque nos jornais do país


Famílias agricultoras e organizações sociais estão realizando mobilizações pelo voto limpo nas eleições deste ano em municípios do Semiárido. Durante os cursos, encontros e intercâmbios que estão sendo realizados através dos programas da Articulação no Semi-Árido (ASA), dezenas de entidades da sociedade civil estão utilizando os spots e o panfleto da campanha “Não Troque seu Voto por Água. A Água é um Direito Seu!”, lançada em julho pela ASA.

“A necessidade da realização é justamente por se tratar de um ano de seca e eleições, em um local que historicamente troca voto por água”, ressalta Alessandro Nunes, coordenador do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2) e assessor técnico da Cáritas Regional Ceará, organização que faz parte da ASA.

Através do site da ASA estão sendo disponibilizados um panfleto e quatro versões de spots. No estado da Paraíba, por exemplo, o material foi utilizado no Encontro de Avaliação Semestral do Coletivo Regional do Cariri, Seridó e Curimataú, que aconteceu nos dias 26 e 27 de julho, na cidade de Campina Grande. “A disponibilidade dos materiais foi muito importante porque também trabalhamos com recursos hídricos e devemos discutir a água como um bem da população que não pode ser trocado por voto ou qualquer outro benefício” alega Cláudia Costa, coordenadora do Coletivo.

No encontro realizado pelo Coletivo Regional do Cariri, Seridó e Curimataú, cerca de 30 agricultores e agricultoras conheceram a Campanha e discutiram o conteúdo dos materiais comunicacionais. A agricultora familiar Betânia Alves, moradora do município paraibano de Juazeirinho, participou da iniciativa e prometeu que vai alertar outras pessoas de sua comunidade sobre os assuntos debatidos: “Estamos no período eleitoral e sabemos que ainda tem agricultores sem consciência dos seus direitos, que acham que ao receber um carro-pipa estão sujeitos a ter que votar naquele candidato”.

No Ceará, o Fórum Cearense pela Vida no Semi-Árido criou um panfleto abordando cinco motivos para os eleitores não aceitarem as promessas de políticos corruptos. Ao todo, 10 mil exemplares deste panfleto estão sendo distribuídos nas microrregiões do estado. Alessandro Nunes confirma também que já estão agendadas reuniões com as seccionais cearenses da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-CE) e da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), além do Ministério Público do Ceará, para tratar sobre os objetivos e possibilidades de parceria para a Campanha.

No Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, a Cáritas Diocesana de Araçuaí está disseminando a Campanha através dos Encontros Comunitários, das Comissões Municipais e do Intercâmbio Interestadual nas cidades de Coronel Murta, Araçuaí e Itinga. Na região, a articulação da Campanha resultou também na veiculação de spots radiofônicos que podem ser ouvidos em rádios comunitárias e alternativas, informando os números telefônicos para os eleitores que precisam denunciar a compra de votos.

O diretor do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Coronel Murta, Robélio Prates, afirma que na comunidade a população está superando o medo de denunciar: “Porque na maioria das vezes essas pessoas [políticos] são poderosas na região e nós não tínhamos condição de recorrer a órgãos maiores e nem tínhamos apoio. Agora como essa campanha as pessoas estão sendo formadas, estão mais conscientes e acho que é possível combater a venda de voto”.

O conteúdo da Campanha é baseado na Lei Federal 9.840/99, conhecida como Lei de Combate à Corrupção Eleitoral. Cada peça comunicacional traz informações sobre o direito à água, a necessidade do voto limpo, os detalhes para denunciar a troca de água por voto, além dos números telefônicos de instituições responsáveis pela fiscalização e julgamento de crimes eleitorais em cada estado.

A Campanha já foi divulgada pelos jornais Estado de Minas (MG), Diário de Pernambuco (PE), Correio Braziliense (DF) e Correio do Povo (AL), além do portal UOL.

Confira os materiais da campanha aqui: http://www.asabrasil.org.br/Portal/Informacoes.asp?COD_MENU=5637 *Com informações de Myrlene Pereira - comunicadora popular da ASA/Cáritas Diocesana de Araçuaí


Fonte: http://www.asabrasil.org.br/Portal/Informacoes.asp?COD_NOTICIA=7438

Os dez anos do Plano Safra da Agricultura Familiar: um convite à reflexão

Os dez anos de Plano Safra da Agricultura Familiar trazem um convite à reflexão sobre os rumos da agricultura familiar e do desenvolvimento rural. Observamos a ampliação nos recursos disponibilizados, a criação de novas políticas públicas, o aperfeiçoamento das já existentes e o reconhecimento político e institucional cada vez maior da categoria social. Em paralelo aos avanços, há muitos desafios e demandas em curso. O artigo é de Valdemar J. Wesz Junior e Catia Grisa.

Na primeira semana de julho deste ano foi lançado mais um Plano Safra da Agricultura Familiar, completando dez anos de planejamento setorial que sinaliza e orienta as ações dirigidas especificamente a esta categoria de agricultores no horizonte de um ano agrícola. Para o ano de 2012/13 foram disponibilizados R$ 22,3 bilhões para as políticas de crédito rural (PRONAF), comercialização (PAA e PNAE), assistência técnica (PNATER), combate à pobreza rural (Brasil Sem Miséria), garantia de preços (PGPAF e PGPM) e seguro da produção (SEAF e Programa Garantia Safra). Como nos anos anteriores, o PRONAF sobressai a este conjunto de políticas públicas, recebendo R$ 18 bilhões, um aumento de 12,5% em relação aos dois últimos anos. Esta ampliação dos recursos segue uma tendência observada ao longo destes dez anos de Plano Safra da Agricultura Familiar, sendo que o valor atual representa mais que o triplo daquele disponibilizado no ano 2003/04 (R$ 5,4 bilhões).

No atual Plano Safra da Agricultura Familiar, o PRONAF mantém o movimento de redução das taxas de juros e ampliação dos limites máximos financiados e da renda para fins de enquadramento dos agricultores no Programa. Os juros do novo Plano Safra variam entre 0,5% e 4%, enquanto no ano 2003/04 oscilavam de 1,5% a 7,5%; o teto do valor financiado para contratos de custeio foi elevado para R$ 80 mil e o de investimento manteve-se em R$ 130 mil como no ano anterior, sendo que em 2003 eram respectivamente R$ 28 mil e R$ 36 mil; ampliou-se o limite de financiamento para algumas linhas do PRONAF, como Agroindústria, Floresta, Jovem, Semiárido e Eco; a renda máxima para enquadramento no PRONAF passou para R$ 160 mil ao passo que no primeiro Plano Safra era de R$ 60 mil [1], e a renda bruta máxima de enquadramento no Grupo B foi elevada para R$ 10 mil, cinco vezes àquela observada em 2003.

Ao longo destes dez anos também aconteceram mudanças importantes nos mecanismos de participação das organizações associativas no Programa. Na safra 2003/04 podiam acessar o PRONAF as cooperativas e associações que tivessem no seu quadro social um mínimo de 90% de agricultores familiares, os quais precisavam responder por 70% da produção. A partir do Plano Safra 2008/09 passaram a ser incluídas as cooperativas que tivessem a sua estrutura social formada por 70% de agricultores familiares, os quais deveriam ser responsáveis por, no mínimo, 55% da produção.

Paralelamente ampliou-se o limite do patrimônio líquido das cooperativas para fins de enquadramento, saindo de R$ 3 milhões em 2003 para R$ 150 milhões na safra 2012/13. O volume de recursos disponibilizados também apresentou grande acréscimo, alcançando atualmente R$ 30 milhões por cooperativa, enquanto que em 2003/04 o máximo permitido era de R$ 720 mil (aumento em 40 vezes).

Assim, o PRONAF passou a disponibilizar um volume crescente de recursos ao apoio das grandes cooperativas. Vislumbra-se, aqui, a opção por uma política de fomento bastante favorável às cooperativas de maior porte em um contexto marcado por fortes desafios à atuação das pequenas cooperativas e pela existência de uma série de barreiras ao envolvimento das associações de produtores na comercialização de produtos agrícolas e no desenvolvimento de atividades com fins econômicos de modo geral. Coloca-se a necessidade de um debate mais aprofundado sobre o perfil de associativismo a ser fomentado pelo PRONAF, considerando os diferentes perfis de agricultores atendidos pelo Programa.

As mudanças identificadas no PRONAF, tanto em nível individual (agricultor familiar) como no fomento ao associativismo, favorecem cada vez mais a participação de um conjunto amplo e diferenciado de agricultores. Todavia, é importante verificar em que medida estas alterações normativas têm se traduzido na democratização do acesso e em uma qualificação dos resultados do Programa. Na safra 2009/10, os pronafianos do grupo B e os beneficiários da reforma agrária (PRONAF A e A/C) acessaram, respectivamente, 9,5% e 2% dos recursos totais, sendo que estes grupos, segundo o Censo Agropecuário 2006, correspondem a 72,2% da agricultura familiar brasileira. De 2003 até 2006 o número de contratos elevou-se para 1,85 milhão e desde então foi reduzindo, alcançando nos últimos anos agrícolas cerca de 1,5 milhão, e o valor médio dos mesmos tem se elevado, passando de R$ 3.344,89 em 2003 para R$ 8.639,97 em 2011.

Nos últimos anos, a região Sul do Brasil voltou a concentrar mais de 50% dos recursos aplicados – somente o Rio Grande do Sul recebeu R$ 3,25 bilhões em 2011 (24,4% do total). Já o Nordeste, que detém metade dos estabelecimentos da agricultura familiar, tem sido beneficiado por apenas 12% dos recursos totais do Programa de 2009 a 2011.

É importante destacar que desde 2003 tem se evidenciado uma tendência de equilíbrio entre as operações de crédito de custeio e de investimento no Programa, diferentemente do período precedente quando os valores de custeio eram expressivamente superiores. Esta mudança tem influência da Linha Mais Alimentos, visto que desde o seu lançamento em 2008 até abril de 2012 já foram comercializados 300 colheitadeiras, quatro mil veículos de transporte de cargas e 44 mil tratores, superando significativamente os menos de sete mil tratores adquiridos nos dez anos anteriores à vigência desta linha específica de financiamento. Enquanto em 2003 a compra de máquinas e equipamentos representava 25% dos contratos de investimento agrícola (com um montante de R$ 95,6 milhões), em 2011 ela passou a dominar mais de 50% desta modalidade de crédito (com um volume superior a R$ 1,5 bilhão) [2]. Também foi importante neste equilíbrio a aquisição de animais, que passou de 4,44% dos contratos e 10,03% dos recursos totais do PRONAF em 2003 para, respectivamente, 21,81% e 17,81% em 2011.

Em termos de custeio agrícola, cabe notar que de 2003 até 2011 dois produtos (milho e soja) são responsáveis por mais de 50% do custeio agrícola aplicados pelo Programa – no Paraná esse valor chega a 80%. Segundo o Anuário Estatístico do Crédito Rural, somando café a estes produtos, os três respondem por 65-70% dos valores totais neste período, com redução na participação do milho e incremento na de soja e café.

Este conjunto de dados do PRONAF chama a atenção para as características da agricultura familiar que tem acessado o Programa. Como visto, não raro diz respeito a um agricultor familiar mais capitalizado, localizado no Sul do Brasil e produtor de commodities agrícolas. É preciso refletir sobre o papel da principal política pública para a agricultura familiar no fortalecimento do conjunto desta categoria social.

No evento de lançamento do Plano Safra 2012/13, outras duas políticas públicas foram recorrentemente destacadas por gestores públicos e representantes de movimentos sociais e sindicais rurais. Trata-se do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), para os quais foram disponibilizados, respectivamente, R$ 1,2 bilhão e R$1,1 bilhão (sendo R$ 148 milhões oriundos do MDA e R$ 1,08 bilhão do MDS). No caso do PNAE, também foi ampliado o limite de compras por agricultor/ano, passando de R$ 9 mil para R$ 20 mil.

Esta mudança, por um lado, permite o fortalecimento dos agricultores inseridos no Programa e, por outro, limita a inclusão de um número maior de agricultores familiares neste mercado institucional. Enquanto o valor por agricultor/ano anterior poderia beneficiar cerca de 130 mil estabelecimentos, admitindo o uso do limite máximo permitido, o novo limite de compras pode atender menos da metade deste número (60 mil).

Além da ampliação de recursos para o PAA, que em 2003 recebeu quase R$ 145 milhões e em 2011 aproximadamente R$ 775 milhões, o novo Plano Safra institucionalizou mais uma modalidade denominada Compra Institucional que permite aos estados e municípios comprar com seus próprios recursos os produtos de agricultores familiares no valor de até R$ 8 mil por fornecedor, podendo destinar estes alimentos para, por exemplo, restaurantes de órgãos públicos, universidades e hospitais públicos.

Ademais, no mesmo evento o governo assinou o Decreto nº. 7.775 de julho de 2012 explicitando, entre outros elementos, a nova gestão do Programa a partir de Termos de Adesão com estados, municípios e consórcios de municípios.

Estas mudanças, somadas às alterações que aconteceram desde a implementação do PAA (criação de modalidades, aumento dos recursos e do número de agricultores e organizações/pessoas beneficiadas, articulação com o Plano Brasil Sem Miséria), contribuíram para dar maior visibilidade e notoriedade ao Programa, o qual é considerado modelo para vários países da África e das Américas do Sul e Central. Nestas mudanças, é importante não perder de vista o papel que o PAA vem desempenhando na construção, estruturação e regulação de mercados para o conjunto da agricultura familiar e na criação e fortalecimento das organizações de produtores, contribuindo, assim, no âmbito da política agrícola e no empoderamento destes atores sociais.

Para a Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER), o novo Plano Safra disponibilizou R$ 542 milhões, valor bem acima dos R$ 40 milhões aplicados em 2003, mas próximo dos recursos ofertados em anos recentes. Desde 2003, um conjunto de mudanças vem ocorrendo com a ATER, envolvendo a ampliação dos recursos, a promulgação da Lei Geral de ATER em 2010, a realização da I Conferência Nacional sobre Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária (CNATER) e a publicação de chamadas públicas diferenciadas para segmentos da agricultura familiar, regiões ou produtos/sistemas específicos. Conforme o Plano Safra 2012/13, todas as novas contratações exigirão ações para melhorar a gestão ambiental da propriedade e reduzir o uso de agrotóxicos, visando promover a “Rota da Sustentabilidade”.

No mesmo dia do lançamento do Plano Safra também foi ressaltada a criação futura de uma Agência Nacional de Extensão Rural, que será um tema importante de discussão no próximo período. Apesar dos avanços realizados para recuperar o papel da ATER em âmbito nacional, é preciso refletir sobre a institucionalidade e as metodologias predefinidas que embasam as chamadas públicas e sua adequação às diferentes realidades locais.

Desde 2003, dois instrumentos foram criados visando à proteção dos estabelecimentos familiares em relação ao clima, preço e renda: Seguro da Agricultura Familiar (SEAF) e Programa de Garantia de Preço da Agricultura Familiar (PGPAF), os quais se somam ao Programa Garantia Safra criado em 2002. Com o novo Plano Safra, o SEAF aumentou a renda assegurada de R$ 3,5 mil para R$ 5 mil, o PGPAF passou a proteger o preço de 46 produtos, incluídos produtos da cesta básica e da sociobiodiversidade, e ambos os programas estenderam suas ações para os pronafianos do Grupo B que contratarem financiamento de custeio. No que concerne ao Garantia Safra, a partir deste ano agrícola o Programa estendeu suas ações para agricultores e municípios de todo o país, anteriormente restrito aos produtores do semiárido.

Antecipando algumas medidas previstas para 2014, o novo Plano Safra dá sequência às ações que vinham sendo desenvolvidas no âmbito do Plano Brasil Sem Miséria, cujo foco é promover a inclusão socioprodutiva do segmento em extrema pobreza. Destacam-se entre as ações a política de ATER, o PAA, o Programa Nacional de Documentação da Trabalhadora Rural (PNDTR) e o Programa de Fomento a Atividades Produtivas Rurais, que distribui aos agricultores recursos não reembolsáveis (R$ 2.400,00) e insumos.

É pertinente destacar que no lançamento do Plano Safra da Agricultura Familiar 2012/13 os movimentos sociais e sindicais rurais ressaltaram a importância da criação e da expansão de programas inovadores para a agricultura familiar. Contudo, cobraram maior atenção e aperfeiçoamento das políticas públicas existentes e reforçaram a necessidade de retomar a política de reforma agrária no país. Como argumentaram as organizações, a acesso ao conjunto de programas destacados no documento passa primordialmente pelo acesso a terra.

É importante ressaltar ainda a dualidade da agricultura brasileira. Na semana anterior ao lançamento do Plano Safra da Agricultura Familiar, o governo divulgou o Plano Agrícola e Pecuário 2012/2013, vinculado ao MAPA e direcionado aos produtores não familiares, os quais, segundo o último Censo Agropecuário, representam 15,6% dos estabelecimentos brasileiros. Neste Plano, o valor oferecido pelo MAPA para o financiamento da produção é seis vezes maior do que aquele da agricultura familiar (o montante chega a R$ 115 bilhões); além disso, enquanto os recursos disponibilizados para agricultura familiar cresceram na ordem de 233% desde 2003, o crédito para os produtores não familiares aumentou 325%.

Nestes dez anos de Plano Safra da Agricultura Familiar, este boletim faz um convite à reflexão sobre os rumos da agricultura familiar e do desenvolvimento rural a partir da contribuição das políticas públicas diferenciadas. Observamos a ampliação nos recursos disponibilizados, a criação de novas políticas públicas, o aperfeiçoamento das já existentes e o reconhecimento político e institucional cada vez maior da categoria social. Em paralelo aos avanços importantes que podem ser notados, há muitos desafios e demandas em curso.

(*) Os autores são pesquisadores do Observatório de Políticas Públicas para a Agricultura (OPPA) do CPDA/UFRRJ.

NOTAS
[1] No Plano Safra 2010/11 foi autorizado o acesso ao PRONAF pelos agricultores familiares com renda bruta anual familiar de até R$ 220 mil, desde que fossem produtores de milho, feijão, soja, arroz, trigo, bovinocultura de corte ou que estivessem em processo de reconversão produtiva do fumo.

[2] Conforme o Anuário Estatístico do Crédito Rural, em termos de recursos para o financiamento de máquinas e equipamentos agrícolas, o Rio Grande do Sul recebeu 44% e a região Sul ¾ do volume total aplicado no país.


Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=20652

5 de julho de 2012

Jovens rurais do Semiárido na tela do Canal Futura

Fonte: http://www.asabrasil.org.br/Portal/Informacoes.asp?COD_NOTICIA=7407
Programa sobre juventude rural está sendo reprisado
Laudenice Oliveira - Centro Sabiá
29/06/2012
Foi reapresentada na quinta-feira, 28, no Canal Futura, o primeiro episódio do Programa Diz Aí sobre a Juventude Rural do Semiárido, cujo tema é Meio Ambiente e Biodiversidade. Este episódio conta com a participação de jovens de Triunfo e Santa Cruz da Baixa Verde, Sertão de Pernambuco, assessorados pelo Centro Sabiá. A reapresentação contou com a participação, ao vivo, do coordenador geral do Centro Sabiá, Alexandre Henrique Bezerra Pires, que foi um dos consultores da série. Os outros dois episódios também serão reprisados. 

28 de junho de 2012

Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental


Em defesa dos bens comuns, contra a mercantilização da vida

Site da Cúpula dos Povos
26/06/2012

Movimentos sociais e populares, sindicatos, povos, organizações da sociedade civil e ambientalistas de todo o mundo presentes na Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, vivenciaram nos acampamentos, nas mobilizações massivas, nos debates, a construção das convergências e alternativas, conscientes de que somos sujeitos de uma outra relação entre humanos e humanas e entre a humanidade e a natureza, assumindo o desafio urgente de frear a nova fase de recomposição do capitalismo e de construir, através de nossas lutas, novos paradigmas de sociedade.

11 de junho de 2012

Carta das Mulheres do Semiárido


Marcha Mundial das mulheres                                              Mossoró, 31 de Maio de 2012.
Entidades da ASA- Potiguar



À Presidenta Dilma Roussef
À Governadora Rosalba Ciarlini
Aos Prefeitos e Prefeitas Municipais
À População Nordestina

Com a seca não tem colheita nem na terra nem no mar.
 A folha que eu trouxe representa a seca do mar.
(Tatiane –Tibau/RN)

Nós, as mulheres, há muito tempo marchamos para denunciar e exigir políticas de convivência com o semiárido e que ponha o fim da opressão que vivemos por sermos mulheres.
Das nossas lutas feministas e das lutas dos demais movimentos sociais nasceram experiências inovadoras de espaços de liberdade para nós mulheres, para nossas filhas e filhos, para todas as pessoas que depois de nós caminharão sobre a terra semiárida.
Estamos construindo um Nordeste no qual a diversidade é uma virtude; tanto a individualidade como a coletividade são fontes de crescimento; onde as relações fluem sem barreiras; onde a palavra, o canto, os sonhos e a caatinga florescem. Esse Nordeste considera a pessoa humana e os bens naturais como uma das riquezas mais preciosas. Um Nordeste no qual reinam a igualdade entre mulheres e homens, convivência com nossas condições climáticas, o respeito e fortalecimento de nossa cultura e a socialização do trabalho doméstico e do cuidado. Este Nordeste, nós somos capazes de construir, nós estamos construindo.
Somos mais da metade da humanidade. Damos a vida, trabalhamos, amamos, criamos, militamos, nos divertimos. Garantimos atualmente a maior parte das tarefas essenciais para a vida e a continuidade da humanidade. No entanto, em momentos críticos como esse período de estiagem continuamos sendo as mais atingidas, por sermos responsáveis por grande parte da produção mercantil e pela produção do viver.
Diante de todos os argumentos já apresentados na carta da ASA/Brasil, na carta do Campo Potiguar e pela nossa experiência como militantes, lutamos por um novo modelo de construção de políticas para o semiárido, tendo como referência a convivência com a situação climática.

Nós da Marcha Mundial das Mulheres reafirmamos que queremos construir um Nordeste onde a exploração, a opressão, a intolerância e as exclusões não existam mais; onde a integridade, a diversidade, os direitos e liberdades de todas e todos sejam respeitados; onde a condição climática não seja mais um meio para ampliar a exploração de homens e mulheres nordestinas. Para isso propomos:

  1. Fortalecer as experiências de convivência com o semiárido protagonizadas pelas mulheres, como forma de se contrapor ao modelo de desenvolvimento disseminado pela economia verde;

  1.  Ampliação e desburocratização dos créditos com abate e reavaliação do saldo devedor; em especial o PRONAF Mulher, bem como liberação imediata do Apoio Mulher;

  1. Políticas públicas estruturantes que garantam o acesso à água, como a cisterna de placas, poços artesanais próximos aos quintais, entre outros;
  2. Resgatar o aprendizado das trabalhadoras e trabalhadores com a energia eólica adaptada, especificamente os cata-ventos, fundamentais para a produção dos quintais;
  3. Ampliação dos quintais produtivos que no momento de estiagem é a principal fonte de alimento familiar, bem como o programa PAIS para as diversas comunidades;
  4. Dentro do programa de construção de creches do governo federal, priorizar a construção de creches para o meio rural, como forma de socializar a tarefa do cuidado e garantir a alimentação das crianças no meio rural;
  5. Incluir como parte das necessidades imediatas da produção do viver, a limpeza da casa, banho das pessoas e lavagem de roupa. Neste sentido, o programa 1 Terra  2 Águas deve considerar a produção e as tarefas do bem viver (cuidado com as pessoas);
  6. Ampliação do valor do Bolsa Família por tempo indeterminado até que cesse a estiagem;
  7. Fortalecer a autodeterminação econômica das mulheres com ampliação do acesso aos programas como POPMR, ATER Mulheres, PNDTR, PAA/Compra Direta;
  8. Readequar imediatamente a legislação para que as mulheres possam voltar a comercializar as polpas de frutas através do PAA e PNAE.

Marcha Mundial das Mulheres

Subscreve essa carta:
Entidades que compõe a ASA- Potiguar:
Terra Viva,
Atos,
Sertão Verde,
Coopervida,
           Pedra de Abelha,
Centro Feminista 8 de Março,
Comissão Pastoral da Terra
CEACRU
Comissões de Mulheres dos STTR
Comissão das mulheres do STTR Apodi; Comissão das mulheres do STTR Caraúbas; Comissão das mulheres do STTR Governador Dix-Sept Rosado; Comissão das mulheres do STTR Barauna; Comissão das mulheres do STTR Filipe Guerra; Comissão das mulheres do STTR Upanema;

Demais Entidades e articulações: Rede Xique-Xique; Coordenação Oeste  de Mulheres Trabalhadoras Rurais; COOTIPESCA; Grupo Mulheres em Ação; PDA Margarida Alves; PDA Jucurí.

Organizações comemoram a volta do CONSEA com banquetaço em Campina Grande

Um conjunto de organizações que atuam na promoção do direito humano à alimentação realizará no dia 27 de fevereiro, segunda-feira, um ‘Banqu...